sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

045 - O fim da APA é inevitável?


 
Após três anos de um mandato manifestamente infeliz a APA vai reunir em Assembleia Geral, convocada para eleger novos corpos sociais. A reunião, a decorrer no final de Março, corre o sério risco de fazer juntar menos de uma dezena dos cerca de quatrocentos associados. Perante isto, é evidente que a APA, depois de um lento definhar ao longo de vários anos, está agora à beira do fim. Como arqueólogo e como responsável da ERA Arqueologia, considero que a situação é muito preocupante.
 
Face à necessidade estratégica de agir e de procurar mobilizar os arqueólogos em torno de causas fundamentais para o incremento da profissão e respectiva afirmação social, a actual direcção mais não fez do que assistir impávida e serenamente ao esvaziar da missão da APA e à debandada quase total dos seus associados. É provável que hoje, por terem as quotas em dia, apenas vinte sócios estejam em condições de votar. A mudança é quase impossível.
 
Mas, porque será que já quase ninguém paga as quotas? A resposta é simples: porque já quase ninguém acredita na APA. A motivação é nula, a descrença parece irreversível e poucos acreditam no pagamento das dívidas em atraso.
 
 
Será definitivo este afastamento da esmagadora maioria dos sócios?
 
 
Em contraponto ao actual sistema em que os arqueólogos são regulados e controlados pela tutela ou pelas entidades empregadoras, acredito num modelo assente na auto-regulação dos profissionais. Por isso, considero fundamental a efectiva reactivação da APA. Em benefício dos arqueólogos e do nosso património arqueológico.
 
 
Mas, como reabilitar a APA? Como se explica o silêncio da actual direcção face ao aproximar das eleições? Que justifica a sua falta de vontade em motivar os associados a participarem no acto eleitoral, nomeadamente através da discussão de ideias e projectos?
 
Para acreditar que uma mudança ainda é possível na APA, proponho um roteiro simples:
 
1 – que nenhuma candidatura seja agora apresentada uma vez que nas actuais circunstâncias qualquer eleição estará ferida de morte pela sua escassa representatividade;
2 – que seja aprovado, já na próxima Assembleia Geral, um perdão generalizado das dívidas acumuladas pelos sócios, criando-se condições para o seu regresso a uma plena participação na vida associativa;
3 – adiamento das eleições para futura Assembleia Geral e mobilização dos sócios em torno de ideias e projectos alternativos que possam ir a votos.
 
 
O perdão das dívidas é uma solução milagrosa para o relançamento da APA? Não. A solução está na participação dos sócios, de muitos sócios, nas suas ideias e na sua capacidade de agir. Perante a óbvia incapacidade e falta de vontade da generalidade dos sócios em pagar as quotas em atraso, esta parece-me a única alternativa que ainda poderá viabilizar o regresso dos associados ao palco da acção. Se tal não acontecer e se os arqueólogos não agarrarem tal oportunidade, deverá ser frontalmente assumida a falência da APA.

5 comentários:

  1. Caro Miguel, temo que nem assim seja possível salvar a APA. Ainda mais, penso que o modelo está esgotado, fazia sentido num contexto de prática da profissão que já não é o que actualmente vivemos (eu, pelo menos, já não o vivo certamente). Fará eventualmente algum sentido manter a APA reconstruindo-a no seio de um novo projecto, mas, mesmo assim, tenho muitas dúvidas

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    1. A APA parece estar num beco sem saída, ou de saída muitíssimo estreita. Precisamente porque a APA está esgotada e porque urge redefinir em absoluto o seu rumo, considero vital a criação de condições mínimas de mobilização dos associados e dos arqueólogos em geral em torno do destino da profissão. Se a APA tem, tanto quanto imagino, menos de vinte associados em condições de integrar listas e de poder votar, que representatividade e que capacidade de agir terá no futuro? O mais importante neste momento não é eleger corpos sociais; o mais urgente é promover o retorno da esmagadora maioria dos associados e a criação de condições para um debate e a constituição de diversas listas assentes em diversas ideias para o futuro. O período eleitoral não pode ser desbaratado.

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  2. Uma achega:
    Os sócios não pagam quotas há muito tempo. Muito provavelmente, porque ao longo dos anos se foi cimentando a ideia de que a Arqueologia enquanto actividade profissional foi gradualmente sendo esvaziada das condições para existir. Por outro lado, a profissionalização/mercantilização teve como sub-produto sucessivas levas de jovens formados em Arqueologia que, se por um lado não estavam preparados para esse mercado de trabalho, por outro não estavam também preparados para compreenderem de que forma o trabalho intelectual se ia proletarizando e como uma das poucas formas de combater esse processo era precisamente a participação em fóruns de discussão profissional como a APA podia ser. Não tiveram essa noção, diga-se, porque ninguém se preocupou em dar-lhes essa perspectiva - nem os professores, que nunca entenderam muito bem que "coisa" é essa da Arqueologia empresarial, nem as empresas, que nunca tiveram grande interesse em que os profissionais que "contratavam" tivessem essa consciência ética, nem a tutela, que simplesmente se dedicou a manter-se seráfica no seu posto de "controlo total do mercado". Como tal, a maioria (arrisco a dizer imensa maioria) desses novos profissionais não se associaram à APA.
    Além disso, neste momento, para a maioria dos arqueólogos não há sequer trabalho que lhes permita pagar as contas, quanto mais para pagar quotas de uma associação que, nos últimos anos, se limitou a estrebuchar lentamente, sem que se lhe conheça qualquer impacto, qualquer capacidade de intervenção na sociedade.
    Porém, em relação à questão de maior fôlego, a do provável desmantelamento da APA, é apenas mais um reflexo de um país em desagregação. Estranho seria que logo uma associação de uma área tão frágil como a Arqueologia sobrevivesse no meio do furacão.

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  3. Mas porque será que as pessoas, mesmo quando fazem comentários sérios e no tom adequado, se escondem atrás do anonimato? Será isso consequência da crise ou uma das razões que contribui para a crise?

    António Valera

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  4. Pois. Porque razão têm as pessoas tanto medo de falar abertamente?

    Está na nossa mão condicionar a evolução da profissão. Não me revejo em visões catastrofistas que impedem a acção. Muito já foi feito ao longo dos anos; é importante continuar o caminho. Todos temos objectivos pessoais, institucionais e colectivos à profissão que nos enquadra. O que temos em comum é seguramente mais do que aquilo que nos separa. Nesse patamar está a capacidade de mobilizar cada vez mais profissionais.

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