No actual
contexto da produção científica, a diversidade e multidisciplinaridade são
fundamentais para o desenvolvimento de novos paradigmas e o descortinar de
novas questões. No âmbito da arqueologia, a geoarqueologia tem-se posicionado
como uma das principais áreas de contacto transdisciplinar, na qual há ainda
muito a acrescentar. Exemplo disso é o trabalho desenvolvido por Tiago do
Pereiro no âmbito do seu mestrado em Geoarqueologia, tese que veio a defender
no início de Março. Num esforço louvável, o signatário, insatisfeito com os
resultados obtidos através dos tradicionais processos de análise de contextos
arqueológicos, lançou-se na procura de alternativas que enriquecessem o estudo
do sítio epipaleolítico da Cruz da Areia.
À costumeira
análise de materiais líricos e sua respectiva dispersão espacial, foi
acrescentado um conjunto de outras análises de pendor geológico. Entre elas, analises
granulométricas dos sedimentos e o estudo morfométrico de balastros, este
último procurando sobretudo evidenciar eventuais padrões na selecção dos
suportes utilizados por estas comunidades na produção dos instrumentos e
utensílios recuperados durante as escavações do sítio, bem como daqueles que
acabaram por ser utilizados como termoacumuladores no âmbito das várias
estruturas de combustão identificadas. Em conjugação com o trabalho de
remontagem dos produtos de debitagem, a sua análise morfo-tecnológica e a sua
dispersão pelos vários sectores, este estudo permitiu a despistagem de
processos pós-deposicionais e o avanço de algumas leituras da biografiade
ocupação do sítio. Foram evidenciadas áreas de actividade preferencial e
diferenças substanciais entre níveis antrópicos e naturais, permitindo um
faseamento mais fino das várias
utilizações. Por outro lado, este estudo poderá ainda servir de base a futuras
análises em sítios menos conservados do que este, nos quais a movimentação
vertical e horizontal de materiais inviabilize uma clara distinção dos níveis
ocupacionais e respectiva segmentação espacial.
Este trabalho
surge assim como um importante exemplo de como (ainda) é possível pensar fora
das gavetas nas quais espartilhamos o nosso conhecimento. As novas perguntas e
novos caminhos que extravasem os limites da compartimentação com que castramos
a inovação são a engrenagem dos motores da ciência, abrindo espaço para novas
ideias e novas teorias, novas gavetas, que espartilhem com mais folga, até que
venham mais perguntas e o processo recomece.
O Tiago
defendeu a sua tese, intitulada “O sítio
Mesolítico Antigo da Cruz da Areia: uma abordagem (Geo)Arqueológica”, no
passado dia 14 de Março. Parabéns ao novo Mestre!
Sem comentários:
Enviar um comentário